Isto não é um poema

Passei o último fim de semana em casa.
Passei o último fim de semana me drogando no sofá da sala.
Passei o último fim de semana desejando segurar gentilmente a tua cabeça enquanto a bato repetidas vezes contra uma pedra até que você perca a consciência.

Eu não tenho me alimentado muito bem.
Eu tenho oscilado entre momentos de alegria extasiante e dores agudas no coração figurativo.
Meu ombro também tem doído bastante.
Por que você tinha que ir embora?
A gente tinha tanta coisa pra fazer.

Às vezes eu vou te ver sorrir nas fotos do facebook.
Nessas horas eu imagino o sangue da tua cabeça e escorrendo pela pedra.
Eu vejo ele esguichando na minha perna.
E me perco imaginando teus olhos revirando à medida que o sangue se esvai.
Cê tenta segurar meu braço, tenta falar... Mas já está muito fraca.
Aí você morre.
E eu te dou um beijo de despedida.

Isso não é um poema.

A lua, mais uma vez, nasce no céu da floresta escura.
A nascente do rio, contínua, verte água límpida e fresca.
E cá estou eu, bêbada, como sempre.
Nua, como tem que ser.
E com uma enorme vontade de enfiar as unhas no pescoço de um homem e comer crua a sua traqueia, temperada com sangue e cominho. 


É uma coisa bem engraçada que quando eu desço as ruelas do Pelourinho pela manhã, a caminho do trabalho, quase sempre tenho a impressão que sou uma personagem não-escrita de Álvares de Azevedo saindo da casa de alguém da nobreza depois de uma noite de orgia .

Me agradam temas como a morte, o sexo e a embriaguez.
Me agrada o gozo. Me agrada o sangue. Me agrada o que é lânguido..
Me fascina a faca enfiada na carne. Me encanta a frieza de um corpo sem vida.

Sim, toda essa morbidez me faz feliz.

provocação

ele disse que ossos, carne e sangue significam vida.
Então sobre o que falarei se o que desejo é a morte?
Não, não seja tolo, não desejo morrer. Desejo a morte.
Desejo o limite entre o estar vivo e o não estar.

Não mais sofro a claridade.
Praguejo a luz do dia.
Embriago-me na praças abertas.

E toda essa poesia gótica já me é natural.
Corre nas veias.

Quando desce a noite, não preciso me vestir de preto.
O santo manto negro já está sobre mim.
Vive sobre mim.
Invisível. Invencível.

Brinco com facas.
E não mais preciso me esconder.
Por isso não te matei.
Por que a morte já me é conhecida.
Já consigo enxerga-la em suas formas mais sutis.

Mas permaneça ao meu lado...
Espere por um dos dias em que o café não estiver quente o suficiente,
Ou um dia em que o esmalte que procuro acabar.
Nesse instante de loucura, meu caro,
você verá seu sangue, de forma nada abstrata, escorrer pelas minhas coxas morenas.

Epitáfio

Sabine era uma prostituta. Fazia um oral como ninguém. Sabine era uma francesa negra de olhos atentos e mãos pequenas. Sabine morreu. Ninguém sabe como nem quando. Sabine morreu. Mas era uma ótima prostituta.

Só me interessa o que não é meu

- Manifesto Antropofágico, Oswald de Andrade